A PRIMEIRA VEZ É
SEMPRE INESQUECÍVEL
Forcejamos. Eu forcejei. Ela forcejou. Mas naquela
noite não conseguíamos fazer amor. Quer marimba mais plangente que o sexo
inconcluso? Logo adivinhamos de falar de nossas vidas pessoais, abrir nossos corações
e revisitar o passado. Eu viajei na maionese. Contei xixicas de quase nada. Falei
de uma ocasião em que mostrei para minha bisavó onde escondiam dela a garrafa
de vinho. “Olha aqui, vózinha, desta vez eles colocaram debaixo da pia”. Com
isto minha bisavó encheu um copo de vinho, depois ficou num canto do alpendre
sorvendo seu tesouro mais sagrado. A seguir revelei que meu primeiro beijo
tinha sido aos dez anos de idade, no rosto de uma garota, minha vizinha na
época. Falei que o rosto dela estava cheio de espinhas e na hora peguei um nojo
de beijar fosse quem fosse. Ouvindo isso, a minha bela parceira demonstrou ter
se aborrecido por esta revelação mais que pueril. No entanto não foi para criticar
minha postura de menino zangão. Ao contrário disso. A seguir ela falou
claramente. “Minha primeira experiência sexual foi com um vizinho de sessenta
anos”. Ambos rimos. Mas logo ela começou a revelar aquilo nos detalhes. “Foi
estranho demais”, ela disse. “O problema é que na janela de meu quarto havia um
defeito com a cortina. Ela não fechava convenientemente. Assim aconteceu de uma
tarde eu ficar totalmente nua e desta forma fui vista por esse vizinho. Para
minha surpresa de menina-moça ele não se portou como um intruso. Antes me fez
um sinal de que estava ali por acaso, depois colocou sobre seu rosto, de forma
pudica, uma capa de disco—o disco era Rubber Soul dos Beatles—e fez sinal com a
outra mão para que eu fechasse a minha janela. No momento em que fechei a
janela eu senti que ele estava ainda acolá, na janela dele, me esperando para
falar algo. Coloquei uma blusa e abri a janela. Para minha definitiva surpresa
ele estava agora com uma rosa colocada diante do rosto e, por detrás daquela
rosa, ele sorria”. Ouvi a revelação dela com os olhos arregalados. Preguiçosamente
acomodado nos travesseiros eu lhe disse que aquilo era muito brega. Mas ela
logo me fez calar. “Não foi algo brega não. Quando ele colocou aquela rosa
diante do rosto ele me ganhou no ato”. Às vezes as pessoas tomam estradas que
apreciam sobremaneira, especialmente se o caminho for de ida e volta. Criam ali
suas preferências pessoais. Não falo que isto seja algo para se preocupar.
Todos agem desta forma. Sábados e domingos são dias sagrados para aqueles que
nada esperam da vida. Pelo menos era o que pensava até ler um dos romances da
escritora Rose Ridge. Ah, como venerei Rose Ridge na minha juventude! Ela que
parecia tocar para mim uma música indizível. Levava-me a viajar num passeio admirável.
Eu sempre fiquei absorto e infalivelmente envolvido pelas aventuras descritas
de maneira exemplar por Rose Ridge. Com ressalvas, devo confessar agora para
minha amante, que Rose Ridge passava longe dos detalhes do amor praticado entre
seus personagens. Havia naquelas páginas um algo refrão, uma instância aquém do
mundo real. Contudo, aliás. Revelações literárias à parte, a minha concubina estava
era aflita por contar detalhes do seu caso com o vizinho de sessenta anos. No
entanto. Indo e vindo nas lembranças que eu tinha dos livros de Rose Ridge, não
consentia que ela entrasse nos detalhes, antes dei de ombros. Ela magoou.
Fingiu que dormia. O assunto parecia perdido para sempre. Até que ela falou
claramente. “Você fica tentando fugir da realidade para se esconder na
literatura. Esses livros nunca vão resolver o que deve ser resolvido na vida
real. Entende?”. Fácil para ela dizer isso. “Mas você já leu algo de Rose
Ridge?”. Perguntei eu, algo inocente. Ela fez um sinal de enfado com uma das
mãos agitando como se estivesse se despedindo de qualquer tipo de conversa.
Então a surpreendi. “Você pelo menos poderia me levar contigo quando for entrar
na casa do seu vizinho e me mostrar como fizeram seu primeiro sexo autorizado”.
Ela então fingiu que estava atuando no teatro ou nas novelas em que trabalhava.
Sim, por acaso não contei ainda que minha amantezinha era francesa e uma
excelente atriz? Pois conto agora. Para ser realista com essa trama amigável e
reveladora. Minha namorada pediu para eu sair do quarto e entrar de novo quando
ela chamasse. Ri disso. Não iria fazer parte dessa pantomima. Mas subitamente
meu cérebro congelou. Brincadeiras francesas me interessam, e minha adorada
francesinha estava por demais convincente, diga-se, aliás, excepcionalmente
convincente. Então saí do quarto e fiquei esperando. Como uma criança que
aguarda o chamado do esconde-esconde após uma contagem de um a dez. Ela, depois
de algum tempo, me autorizou a entrar. “Pode vir agora!”. Assim que entrei no
quarto eu tomei uma surpresa. Ela estava novamente vestida e fizera o make-up.
Estava com batom recém aplicado. Seus cabelos ajeitados num juvenil
rabo-de-cavalo. E, ao mais, ela se produziu com uma minissaia xadrez e trazia
uma blusa branca que exibia um recorte acima dos seios de forma bastante
sensual. Parecia mesmo uma jovenzinha de não mais de dezesseis anos. “Mas o que
é isso?”. Perguntei. Ela rapidamente colocou o dedo em riste sobre seus lábios.
“Shhh!”. Era hora de fazer silêncio. Então obedeci a seu comando. Foi quando
ela levantou aos poucos sua minissaia e revelou que estava sem calcinhas. Por
tudo que é mais sagrado. A minha garota francesa me deixou absolutamente louco
para fazer amor com ela. E foi o que fizemos. Então a ficha caiu. Claro que
sim! Havia sido daquela maneira que ela se oferecera para iniciar-se em sua primeira transa. Foi exatamente assim que ela conquistou seu vizinho para sua
aventura inicial no amor consentido.
Beto Palaio
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