julho 31, 2011

Percebo melhor a direção das nuvens se paro de caminhar.

Quando mordo uma fatia de melão, ela dissimula minha boca.

Quando eu penso intensamente em alguma coisa, eu deixo de ver aquilo que eu estou olhando.

Ao mexer minhas pernas com força eu espanto a mosca que havia pousado ali.

Quando coço a cabeça sob um gorro de lã o gorro se desloca.

Com um simples movimento de língua, eu desloco um pedaço de amendoim preso entre dois dentes.

Quando caminho, há sempre um de meus pés que desaparece atrás de mim.

Quando eu cheiro um filete de lavanda, o filete pode acabar em uma de minhas narinas

Conforme a parte do corpo que eu coce, produzo um som diferente.

Quando cruzo as pernas embaixo da mesa, às vezes bato com o joelho.

Parado sob o sol, graças à posição de meu ombro, posso, de maneira aproximada, saber que horas são.

Quando eu fecho meu olho esquerdo ou direito e envesgo o outro, posso ver meu nariz.

Às vezes eu quero pousar um cotovelo na mesa e o cotovelo desliza sobre o vazio.

Com um monte de livros nos braços, subo uma escada sem olhar os degraus.

Ao roçar a ponta dos dedos contra os lábios eu simulo um beijo.

Posso produzir um barulho considerável se continuo a sugar com o canudinho o líquido que restou no fundo de um copo.

NATHALIE QUINTANE

julho 28, 2011

FRIDA.

“La tragedia es lo más
ridículo que tiene ‘el hombre’
pero estoy segura, de que los
animales, aunque ‘sufren’,
no exiben su ‘pena’
en ‘teatros’ abiertos, ni
‘cerrados’ (los ‘hogares’).
Y su dolor es más cierto
que cualquier imagen
que pueda cada hombre
‘representar’ o sentir
como dolorosa.”

Poema do Diário de Frida Kahlo (1907-1954)



PERFÍDIA•SORTE•DOR•ALEGRIA•DE•VIVER•ARTE

julho 25, 2011



TUDO AO LONGO DA TORRE DE VIGIA


O ladrão chamado Gravata já estava lá quando o Coringa chegou.
Naquele altar montado num quarto do hotel do YMCA em Lavandisca, no México. Tudo muito escondido da administração do hotel, pessoas sérias, dadas a acreditarem no holocausto como salvação pessoal, mas nunca na salvação oriunda com o sacrifício de animais. Principalmente com o sacrifício de uma cabra dentro do hotel deles.
- Mas que droga é essa?
O Coringa acabara de entrar no quarto e estava transtornado. Ele não imaginava que o Gravata, seu sócio ocasional, fosse praticante das magias africanas e do vodu.
- Porra, isto está me incomodando. Dá para se livrar desse bicho, ô Gravata?
O ladrão nem se importou em sair da frente da TV. Apenas apontou para o terraço onde duas pessoas estavam tomando vinho, sentados numa pequena mesa redonda.
- Fica frio, essa cabra é de um daqueles caras...
O Coringa foi até a sacada do hotel e gostou do que ouvia.
Um homem de negócios combinava algo sacana com um agricultor, um cara que arava os campos perto da cidade de Lavandisca.
- Olha lá, Matuto... Será que o saco plástico agüenta bem no estômago de uma cabra até chegar aos Estados Unidos?
- Sossega homem... Tão certo como essa torre nunca cairá...
- Torre?
- Isto tudo aqui...
O homem do campo, dono da cabra, a sorver do bom vinho tinto, às atitudes, embora posto em sossego, ali apenas por acaso, para um negócio escuso, como talvez todos nós, neste acanhado orbe terrestre, com maneiras simples, esse homem, tomando do néctar de Baco, à mesa de negociação, fez um gesto apenas, simples como um girar de compasso, com seu dedo indicador, em riste, ao circular em torno de seu próprio punho, múltiplos significados, do prédio do hotel YMCA, e toda a cidade de Lavandisca, mais apropriadamente, todas as cidades do mundo, ou Chicago ou Rio de Janeiro ou Los Angeles ou Madri ou Tóquio ou São Paulo ou Lima ou Moscou ou Foz do Iguaçu, todas elas, apenas sendo torres, fechadas em si mesmas, a guardar os mantenedores, da prática do oculto, da verossimilhança, como Babel, no papel de embrulho, no céu de porcelana, nas atitudes de cada um.
- Ah, não esquente sua cabeça...
O homem de negócios acalmou as pretensões bíblicas do agricultor. E logo se levantou, com gestos subservientes, ao ver que chegava o Coringa.
- Como vai essa força, Coringa?
- Tudo nos conformes... E então? Alguma coisa nova por aqui?
- Apenas detalhes da transferência da mercadoria...
- Ah, sim...
- Que irão para a América dentro de centenas de cabras...
- Entendi... E para que essa cerimônia?
- O Matuto acha que devemos sacrificar uma cabra para que todo o rebanho passe pela alfândega sem chamar a atenção... Coisas que ele aprendeu com o grande Mojo... O obscuro... O transferidor...
- Pois que se sacrifique a cabra...
Depois o ladrão chamado Gravata, que estava vendo a TV, comentou algo amavelmente, como para justificar seu apoio ao sacrifício do animal:
- Nenhuma razão para ficarmos excitados... Há muitos aqui, principalmente dentro desse hotel, que pensam da vida ser mesmo uma piada...
O Coringa pareceu se irritar com aquele súbito comentário do Gravata:
- Mas você e eu—nós, não é?—já passamos por isso... Matar, ainda que seja apenas um bicho, não é nosso destino... Mas é a necessidade... Então vamos parar de falar hipocritamente... A hora do pega prá capar está começando tarde demais... Pode sujar que a moça da limpeza depois faz a faxina...
Tudo o que ocorre ao longo da torre de vigia. Trapaças, esquemas e artimanhas. Os príncipes do capital flutuante ali mantêm seus olheiros. Maracutáia é o epíteto desse imenso circo. Quando todas as mulheres sem rumo vieram, acomodaram-se na mesa do vinho farto, e depois se foram. Muito embora. Entretanto. O dia de hoje foi reservado para o sacrifício. O lavrador está ainda assustado com tanta sangueira. Ao vender ali suas cabrinhas ele pensou nos seus empregados descalços. E também. Quem sabe? Sabe-se lá!
- Segurem a cabra que o Matuto corta o pescoço dela...
Lá fora. Na distância fria. Um gato selvagem rosnou. Dois cavaleiros estavam se aproximando da rua principal de Lavandisca. E o vento começou a uivar. Tudo ao longo da torre de vigia.
(Conto de Beto Palaio, inspirado em All Along the Watchtower - Jimi Hendrix)



CLIQUE no ALL ALONG THE WATCHTOWER aqui:
FD J Borges

Sangue para o Drácula, filme em 3D de Warhol.


Lady Gaga sonhou que Andy Warhol era

o guia espiritual de sua carreira musical,

daí a produzir um show baseado num livro

sobre o artista pop foi um passo



Custom paper 3D Glasses


"Warhol disse que a arte deve ser cheia de

significado em suas formas básicas... Tenho

a ver com ele: eu faço um pop eletrônico sem

alma".



Lady Gaga: Quem atirou no Doce Warhol?



julho 24, 2011


Romy Schneider (1938 -1982)

Loving Romy Schneider

Adorando Romy Schneider



By David St. John


It was a line from Schiller

Era uma fala de Schiller

Set by Schumann, I think, that she wrote

Composta por Schumann, eu acho, que ela copiou

In the flyleaf of the small photo album

Na folha de rosto do seu pequeno álbum

Filled entirely with postcards of nudes

Inteiramente tomado por postais com nus

Some male & some female-but each

Mostrando homens & mulheres—mas cada um

More miraculous (not to mention immortal)

Algo fantásticos (para não dizer imortais)

In their marble flesh than we, who, of course,

Em sua pele de mármore ao que, nós, quem, de fato

Exhausted & sleepless & spent, collapsed into

Esgotados & atentos & entregues, desmaiávamos assim

That coma of the loved & wounded, or vice versa.

No coma dos adorados & feridos, ou vice-versa.

Of all the nudes, I preferred the Rodins,

De todos aqueles nus, sempre preferi os de Rodin,

Those postcards being a little grainy & indistinct,

Naqueles postais estando um tanto granulados e gastos

Sort of how I think of myself in the early morning.

O que combinava comigo ao acordar pela manhã

Then I put the Schumann on my ancient, almost antique

Então coloco Schumann naquela velha, quase relíquia,

Turntable, & the whole of my fate revolves slowly

Vitrola, & meu inteiro destino gira calmamente

Into some kind of brutal focus, at last.

Num arremedo cruel de luzes da ribalta, por fim.


David St. John


David was born in Fresno, California. He has been honored

with many prizes, including the Guggenheim Foundation

prize for poetry.

David nasceu em Fresno, California. Ele já teve a honra

de ser premiado inúmeras vezes, inclusive ganhando o

prêmio concedido pela Fundação Guggenheim para poesia.




Tradução: Beto Palaio

julho 23, 2011



sobre a arte
do culto à imagem

falácia irrefutável
mentira inconvincente
verdade deslavada
calúnia inatacável
sublime escárnio
milagre incontestável
de ateu canonizado



...texto não é legenda
é cara a cara
na entrelinha...


Mais Igor K Marques aqui:

julho 20, 2011

A silhueta do homem primitivo
(A mesma que ainda hoje, transformada
Passa sobre o mosaico da Avenida)

WomanSilhouettes Caracteres Válidos

Quando na treva reproduz-se a vida
Para esse, a cidade se oferece
Num clima universal de eternidade

SEXY_SPANISH_WOMAN SILUETAS Caracteres Válidos

Eu te amo, mulher adormecida
Junto ao mar! eu te amo em tua absoluta
Nudez ao sol e placidez ao luar.


Haicáis retirados do Poeta em Trânsito, de Vinícius de Moraes.

julho 17, 2011

A DANÇA


Façamos da interrupção um caminho novo. Da queda um passo de dança, do medo uma escada, do sonho uma ponte, da procura um encontro!Quem não ouve a melodia acha maluco quem dança...Perdido seja para nós aquele dia em que não se dançou nem uma vez! E falsa seja para nós toda a verdade que não tenha sido acompanhada por uma gargalhada!Há um grande vento frio cavalgando as ondas,mas o céu está limpo e o sol muito claro.Duas aves dançam sobre as espumas assanhadas. As cigarras não cantam mais. Talvez tenha acabado o verão.A dança?Não é movimento, súbito gesto musical. É concentração,num momento, da humana graça natural

obras de edgar degas para frases sobre dança (na ordem) de fernando sabino - oswaldo montenegro - friedrich nietzsche - rubem braga - carlos drummond de andrade

julho 13, 2011

BRUCE NAUMAN & CAMÕES

Peixes e cabeças na Fonte dos Cem Peixes.


A instalação de Bruce Nauman (A Fonte dos Cem Peixes) é composta de noventa

Bruce Nauman, Three Heads Fountain (Juliet, Andrew, Rinde), 2005

e sete peixes de bronze que jorram água o tempo todo. A água segue o trajeto das fontes habituais que são armazenadas numa base e bombeadas de volta pra serem relançadas. Mas aqui nada é executado de forma aleatória, havendo uma conjugação de ações orquestradas entre os diversos peixes de


metal. Ainstalação é completada por três cabeças humanas, feitas de resina epóxi e amarradas com arame, atores também participantes da ação geral de reter e expulsar água.




DESCALÇA VAI A FONTE


Descalça vai para a fonte
Lianor pela verdura;
Vai fermosa, e não segura.

Leva na cabeça o pote,
O testo nas mãos de prata,
Cinta de fina escarlata,
Sainho de chamelote;
Traz a vasquinha de cote,
Mais branca que a neve pura.
Vai fermosa e não segura.

Descobre a touca a garganta,
Cabelos de ouro entrançado
Fita de cor de encarnado,
Tão linda que o mundo espanta.
Chove nela graça tanta,
Que dá graça à fermosura.
Vai fermosa e não segura.

Luís de Camões