O CANDIDATO
Impertinente. Quanta impertinência. Que
petulância. Há perguntas que não podem ser feitas. Muito menos respondidas.
Já enfrentei coisas assim outras vezes, mas
esta aqui é demais. Como está minha boca, meus olhos, a posição da minha
cabeça? O ar de sorriso é suficiente? Estou piscando muito? Minhas mãos, como
estão? Não posso vê-las, não posso baixar os olhos agora.
Não posso sequer me mexer, tenho de parecer
absolutamente verossímil.
Ah, um espelho. Meus votos por um espelho. Ah
não, isto não. Só quero alguém que me diga "você está bem, tudo está indo
muito bem". Eu pago.
O terno tem bom caimento? A gravata está no
centro da gola?
Opa, meu ombro... meu ombro esquerdo...
Pára de tremer, ombro.
Pronto. Tudo está parado, estanque, calmo.
Estou calmo e acho que pareço o mais verdadeiro dos mortais. Minha mulher
sempre acreditou, minha amante também. Elas acreditaram. Todos acreditaram
sempre.
Estou sereno. Estou muito sereno agora e já
posso responder. Vou-me inclinar devagar para o microfone e responder
sucintamente em voz firme, segura mas gentil.
Vamos lá:
- "Não, meu caro repórter... Não."
Jane Chiessi Zandonadi
Ilustração:
Antonio Nássara
Nenhum comentário:
Postar um comentário